sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Cinemagic, Sound of Music & Salzburg


Cinemagic: uma das muitas coisas que vou sentir falta quando não mais viver no Kuwait...

O Cinemagic é basicamente um cinema à céu aberto no Kuwait. Ele fica na laje de um centro comercial decadente que, por sorte, fica a minutos da minha casa. O setup é um pouco “patatero”, o local é bastante improvisado mas é muito cool  e cheio de Umami.

Parece que  uma produtora-escola caseira, conseguiu o equipamento de projeção, e deve haver “arranjado” um acordo ao melhor estilo Kuwaiti para passar sessões de filmes no teto desse centro comercial. Você paga R$5 (há pouco era gratuito) e pode assistir o filme com direito a pipoca, refrigerante, café e chá (o vinho e o prosecco ainda estão em fase de “desembaraço”).

Além da originalidade da idéia, do ambiente acolhedor e da informalidade na execução (coisas que deixam saudades na vida das grandes metrópoles) o repertório é de filmes e cinema de verdade e não de show pirotécnico de tecnologia. Já vi de tudo lá, filme russo, tcheco, espanhol, italiano, coreano, americano bom e até “Central do Brasil” já fez sua aparição por lá.

Ontem fui sozinho assistir “Sound of Music” (eu sei, eu sei, imperdoável não haver assistido até hoje!). A noite estava (atipicamente) fria; o céu estava (atipicamente) estrelado. Estava tão frio e eu tão despreparado que antes de começar o filme eu pensei: “será mesmo que eu vou enfrentar 3 horas de um musical de 1965 sentado aqui como um pingüim?”

“Sound of Music” é um musical quase infantil sobre uma mulher austríaca que deixa de ser freira em um convento em Salzburg e passa a ser governanta na casa de um capitão Naval viúvo com sete filhos. O filme começa produzindo mixed feelings como qualquer filme de décadas passadas. A imagem é um pouco como uma calça jeans lavada. A câmera vai varrendo os Alpes com algum tremor que só pode se esperar de uma filmagem antiga. As primeiras músicas requerem alguma ambientação e digestão inicial.

Mas aí a encantadora Julie Andrews (Maria), que impressiona pela doçura e naturalidade que transmite durante toda a atuação vai sorrateiramente te envolvendo. Sua naturalidade é tamanha, que na cena que ela rejeita ser chamada por um apito, ela consegue arrancar feições de desgosto do espectador. E com seu encanto, música após música as 3 horas começam a voar no relógio.

Obviamente, o ponto máximo é quando Maria canta Dó-Ré-Mi. Algo mágico acontecia com o platéia nesse momento. Primeiro, de golpe, fiquei tomado por uma inesperada emoção que fez meus olhos ficaram molhados. Escuto um suspiro e percebo que a mulher ao meu lado já estava em um estágio mais avançado de choro. Ainda emocionado, passo os olhos ao redor e percebo às pessoas em um misto de lágrimas e sorrisos, cabeças balançando, e pés “bailando” na batida da música. Por um segundo olho para o céu estrelado e volto para o filme pensando: Que bonito! Esse é um daqueles soborosos mistérios da arte...

A seguir, Christopher Plummer dá uma guinada de 180 graus no personagem, e passa de capitão durão a um personagem sensível em uma brilhante atuação ao lado de Maria.
Infelizmente o final não é bom. Os últimos 30 minutos sofrem da mesma doença de outros filmes de pós-guerra que trocam a poesia por engajamentos anti-militares. Mesmo assim não chega em absoluto a comprometer o valor do filme.

Adorei. Eu recomendo com as ressalvas naturais de que é um musical (do tipo ame-o ou deixe-o), é um filme de 65 e demanda boas 3 horas. Não é para todo mundo... Como eu particularmente gosto de musical foi prato cheio.



Outro plus é que a história se passa em Salzburg. Estive em Salzburg no começo do ano em uma viagem que incluiu Rotenburg, Munique, Salzburg, Cezky Krumlov e Praga.

Salzburg é um bom-bom de cidade. Pequena, medieval, organizada, calma, romântica. Gostei do povo austríaco. Guardam um pouco da organização do alemão mas adicionam bastante flexibilidade e educação são sempre muito polidos, reservados e agradáveis. Acabei ficando 3 dias inteiros e não poderia ficar mais. Não uma surpresa, a cidade respira música clássica e Mozart e “Sound of Music” are everywhere e continuam presentes a cada esquina de Salzburg.

Mandatório ficar no hotel “Goldener Hirsch”, que corre o risco de ser o melhor hotel butique que já me hospedei. O hotel tem tudo a ver com Salzburg no inverno e a hospitalidade austríaca do staff é impecável. Apesar do café-da-manhã do hotel ser excelente, não dá para evitar o breakfast menu no café-restaurante em frente ao hotel (que eu não lembro o nome). O lugar é modernex-austríaco, com dois andares , e tem um café-da-manhã imperdível.

Os jantares com concertos são um pelim turísticos mais na minha opinião valem muito a pena (um pouco como o Señor Tango em Buenos Aires).

Foi uma pena não haver assistido “Sound of Music” antes de ir a Salzburg, mas pelo menos teve o benefício reverso de fazer o filme mais próximo e familiar.

Enfim, foi uma noite cheia de Umami no desértico e árido Kuwait...